O racismo é um tema latente nas discussões sociais que tangem este mundo disruptivo e contemporâneo. Falando sobre pautas raciais aqui no perfil percebo que há muitas teorias e opiniões sobre racismo estrutural. E como a desinformação leva à negação, incompreensão e intolerância. Prometi falar sobre o tema e cá estou!
Este artigo está embasado em fatos. Por isto, recomendo que pare, reflita, mas leia até o final sem concluir que um parágrafo te fará dominar o tema. 😉
Vamos iniciar com uma distinção conceitual importante: racismo, discriminação e preconceito NÃO SÃO, a mesma coisa. Preconceito é um julgamento sem conhecimento de causa, ou seja, julgar algo ou alguém sem antes conhecer. Discriminação é o ato de diferenciar, de tratar pessoas de modo diferente por diversos motivos. Já o racismo é uma forma de preconceito ou discriminação que possui a cor da pele ou origem étnica como alvo e que se manifesta por meio de práticas conscientes ou inconscientes.
A IMPORTÂNCIA DA HISTÓRIA PARA ENTENDER O CONCEITO
Para entender as raízes do racismo estrutural no Brasil , como essa história começou e se perpetua até os dias de hoje, é necessário voltar ao início século XVI, onde foi instituída a escravidão. Senta que lá vem história ….
Após o fim da idade média, as nações europeias iniciaram o processo de colonização nas sociedades das américas e da África. Neste processo, os colonizadores europeus não apenas exploraram os recursos dos países colonizados, mas também implementaram um sistema de dominação cultural sobre os povos nativos dessas regiões. Estas comunidades majoritariamente compostas por indígenas e negros, eram vistos pelos colonizadores como não civilizados, impuros ou irracionais e por isto foram forçados a se adaptarem ao modelo de vida europeu.
Mas isto ainda fica pior, quando entendemos que estas pessoas também foram escravizadas, submetidas a condições desumanas de vida e no caso das mulheres, também violadas sexualmente. E infelizmente, isto é só a ponta do iceberg!
Este processo desumano e de sofrimento perdurou-se por três séculos resultando na aniquilação de várias comunidades, e só teve fim em 1888 com a promulgação da lei áurea. Não por piedade, compaixão ou misericórdia (como foi ensinado nos livros de história) mas devido a resistência dos negros escravizados, somado ao interesse econômico internacional. Isto porque o Brasil foi um dos últimos países a assinar o decreto que determinava liberdade aos povos escravizados, ficando atrás apenas na Nigéria e Arábia Saudita.
Com a lei áurea 1.500.000 (um milhão e meio) de pessoas escravizadas foram ‘’libertas’’ e inseridas na sociedade sem nenhum suporte. Sem emprego, sem direitos, sem moradia digna e sem condições básicas de sobrevivência!
Isto significa que mesmo conquistando o direito fundamental à liberdade, isto não garantia outros direitos básicos como: igualdade, dignidade, segurança, e propriedade. Não foi elaborada nenhuma lei que contribuísse para combater este abismo social causado por um processo histórico de opressão e desvantagens.
Se, antes da abolição, a legislação parecia não ter relação direta com o racismo, em 1890, com as primeiras leis penais da República, isso ficou evidente com a instituição da Lei dos Vadios e Capoeiras.
''Art. 399. Deixar de exercitar profissão, oficio, ou qualquer mister em que ganhe a vida, não possuindo meios de subsistência e domicilio certo em que habite Art. 402. Fazer nas ruas e praças publicas exercícios de agilidade e destreza corporal conhecidos pela denominação capoeiragem; andar em correrias. Pena - de prisão por dois a seis meses.''
Sim, é isto mesmo que você leu. Mesmo sem estrutura, terras, educação ou trabalho, os negros que eram encontrados na rua ou que praticassem a capoeira poderiam ser presos.
A partir desta lei, criou-se um estigma que pessoas negras eram preguiçosas e não gostavam de trabalhar. Neste momento não restava outra alternativa a não ser ocupar os locais que naquele momento ninguém gostaria de estar (como os morros) formando então, as favelas.
A reflexão mais importante a se fazer neste momento, é que a ‘’liberdade’’ de fato ocorreu. Mas ocorreu em uma sociedade, onde os lugares, as pessoas e as oportunidades ainda preservavam um pensamento escravocrata que resultou em todas estas ações e a partir disso nasce o que chamamos de racismo estrutural.
'' OK, MAS ISTO FOI ANTIGAMENTE. HOJE NÃO EXISTE ESCRAVIDÃO E POR LEI O RACISMO É CRIME INSTITUCIONAL ''
De fato, a Lei Caó 7.716 foi criada em 1989 e foi a primeira vez em que a legislação contribuiu, de fato, para a democracia racial no Brasil. A partir desta lei o racismo se tornou crime inafiançável e imprescritível com pena de reclusão de até cinco anos.
Só que... Quantas pessoas temos reclusas no sistema carcerário Brasileiro condenadas por crime de racismo? (antes de responder, lembre-se que no ranking mundial de países racistas, estamos entre o ''top 10''.)
Apenas esta lei não é suficiente para resolver o problema pois em sociedades como a brasileira, o racismo determina a forma como pensamos. Assim, a cor da pele significa muito mais do que um traço da aparência. Ela é associada a capacidades intelectuais, sexuais e físicas. É como se ser negro estivesse associado a qualidades físicas como dança, os esportes ou o trabalho pesado e não intelectuais.
Para que não lhe reste dúvidas, trouxe alguns exemplos...
Vamos começar com um fato que é o apagamento da cultura indígena e a constante invisibilização dessas populações. Não podemos deixar de falar do preconceito ou intolerância contra as religiões de matrizes africanas, como o candomblé.
Temos também as falas e hábitos pejorativos incorporados que promovem a exclusão e o preconceito mesmo que indiretamente. Como o uso das palavras “denegrir”, “negativo”, “mercado negro” ou o uso de ditos populares como: “ a coisa tá preta”, “inveja branca”, “não sou tuas negas”!
DADOS ESTATÍSTICOS
Dados de 2017 publicados no Atlas da Violência, divulgado pelo IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, indicam que a cada cem pessoas assassinadas no Brasil, 71 são negras.
Apesar de cerca de 55% da população brasileira ser negra, a maior parte das pessoas que ocupam as universidades, cargos executivos ou espaços políticos são brancos.
O número de negros entre a parcela mais pobre do país é de 76%, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) , feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),
Entre 2003 e 2019, o número de mulheres negras assassinadas cresceu 54%, enquanto o índice de feminicídios de mulheres brancas caiu 10% no mesmo período
Dos personagens retratados pela literatura nacional, 60% dos protagonistas são homens e 80% deles, brancos.
De acordo com o Departamento Penitenciário Nacional (Depen), em 2014, 61% dos encarcerados são pretos ou pardos. O 14º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado em 2020, revela a mesma tendência. Segundo o documento, a cada três presos, dois são negros. Os dados ainda indicam que, em quinze anos, a proporção de negros encarcerados cresceu 14%, enquanto a de brancos foi reduzida em 19%.
'' Ok, eu entendi o que aconteceu e sinto muito. Mas, apesar de ser uma pessoa branca eu não tenho culpa de nada disto. Colocar negros sempre em pauta não é uma forma de racismo reverso?''
Vamos refletir sobre este ponto… Podemos definir o racismo inverso (ou reverso) como uma forma de preconceito ou injúria de motivação racial proferida contra uma pessoa branca.
Ao pensar neste contexto, é preciso levar em consideração que o racismo, para que seja constatado, deve ir muito além das ofensas verbais. Trata-se da ofensa, da violência e do preconceito aliados a um histórico social de exclusão e marginalização, ou seja, foi necessário que pessoas negras fossem sistematicamente discriminadas, excluídas e maltratadas (aquela história que contei acima) para que atitudes de preconceitos contra esta população fossem consideradas racistas.
O racismo ocorre contra a classe historicamente oprimida e nunca contra a classe que sempre foi dominante e opressora. Por isto, não é possível falar de racismo inverso na medida em que não houve, até então, no Ocidente moderno, qualquer indício de subjugação, escravização e marginalização dos povos brancos.
Esta disparidade orienta e conduz, até os dias de hoje, as relações econômicas, sociais, culturais e institucionais do país. Por isto falamos de racismo estrutural, pois é uma problema que está na estrutura da sociedade. E todo este contexto histórico pautado em dados estatísticos reforça a importância que empresas da iniciativa privada falem sobre diversidade e tenham ações genuínas voltadas para inclusão, e que o poder público tenha mais ações e leis como Nº 12.711, de 29 de Agosto de 2012 mais conhecida como LEI DE COTAS.
Ufa, falamos bastante sobre o assunto e por aqui me despeço com a certeza que não precisarei detalhar a lei de cotas. Afinal, agora você já entende o motivo a necessidade de politicas afirmativas. Certo?
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